Assim como houve um interlúdio entre o sexto e o sétimo selo, há um também entre a sexta e a sétima trombeta. Este interlúdio abrange o capítulo 10 e parte do 11. Inclui a visão dos sete trovões e das duas testemunhas. A sétima trombeta não será tocada até o capítulo 11.15.
I - Outro Anjo Poderoso Desce do Céu (Ap 10.1,2)
"E vi outro anjo forte, que descia do céu, vestido de uma nuvem, e por cima da sua cabeça estava o arco celeste, e o seu rosto era como o sol, e os seus pés como colunas de fogo; e tinha na sua mão um livrinho aberto, e pôs o seu pé direito sobre o mar, e o esquerdo sobre a terra."
Na primeira destas visões, João vê outro anjo poderoso descendo do céu. É "outro" porque não tem entrado em cena até este instante. Ao mesmo tempo, o termo grego allus indica ser ele outro, porém da mesma natureza, como aqueles seres angelicais já mencionados. Pelo fato de João ter visto este anjo "descendo do céu", é óbvio que estivesse o apóstolo na terra e não no céu, para onde fora arrebatado em Apocalipse 4.1,2. O versículo oito é uma indicação a mais de que João está na terra, ouvindo de novo "a voz...vinda do céu". Agora, não é explicado como João veio a localizar-se noutro lugar. A descrição do anjo é incomum. Coroado com um arco-íris e vestido de nuvem, sua face é brilhante como o Sol, e seus pés são como colunas de fogo. Em virtude desta linguagem ser similar à da descrição de Jesus em Apocalipse capítulo um, e alguma das frases serem usadas noutros lugares para referir-se a Deus, alguns escritores identificam este anjo com Jesus em sua descida do céu para reivindicar a terra como a sua possessão. (1) Entretanto, Jesus não é chamado de anjo em nenhum lugar do Apocalipse. Aliás, Ele dificilmente seria aqui identificado meramente como outro anjo. Além disso, ninguém presta adoração a ser angelical. E, pela forma como faz o juramento por Deus, em 10.6, caracteriza-se mais como anjo do que como o Filho de Deus. Na verdade, a descrição do anjo simplesmente chama a atenção por sua glória celestial. Alguns o identificam com Gabriel, cujo nome significa “o poderoso de Deus”. (2) A nuvem e o arco-íris lembram a fidelidade
divina para com suas promessas. As "colunas de fogo" falam tanto da proteção como do julgamento. O anjo tem em suas mãos um pequeno livro, ou pergaminho, que não traz nenhum selo e já se acha desenrolado e aberto em suas mãos. A palavra grega biblaridion indica que este é um pequeno livro, um livrinho, não o do capítulo cinco que Jesus abriu. Este anjo não é somente grande em poder, mas também em tamanho. Assim que chega à terra, coloca um pé sobre o mar e outro sobre a terra. Sua mensagem afeta o mundo todo. (3) Há um tremendo contraste entre os rebeldes do capítulo nove, que não se arrependeram, e este glorioso e colossal ente celeste.
II - Sete Trovões (Ap 10.3,4)
"E clamou com grande voz, como quando brama o leão; e, havendo clamado, os sete trovões fizeram soar as suas vozes. E. sendo ouvidas dos sete trovões as suas vozes, eu ia escrevê-las, e ouvi uma voz do céu, que me dizia: Sela o que os sete trovões falaram, e não o escrevas."
O anjo possuía uma voz poderosa. O seu brado ressoa fortemente por todo mundo como o rosnar dum leão (compare com Am 3.8 e Os 11.10, onde a voz de Deus é comparada com a de um leão). Com o clamor do anjo, sete trovões elevam suas próprias vozes (compare SI 29.3, onde a voz de Deus é como a do trovão). Os sete trovões não rosnam, mas falam. Eles têm uma mensagem inteligível. Desde que os sete selos e as sete trombetas envolvem uma sequencia de eventos, é razoável presumir que os trovões também revelem uma sequencia de fatos. Talvez uma série de pragas a ser desferida durante a tribulação, prefigurando julgamentos piores. Vemos ainda que todas as outras passagens do Apocalipse, que mencionam trovões (Ap 8.5; 11.19; 16.18), indicam ira e julgamento divinos. Alguns comparam os trovões aos sete efeitos do relampejar da voz de Deus no Salmo 29.3- 9.(4) Tanto a voz do anjo como a voz dos trovões, mesmo ignorando-se o conteúdo da mensagem, testificam ao mundo da majestade e do poder de Deus. João já havia recebido ordens para escrever (Ap 1.14). Ele presume, então, que deveria anotar o conteúdo da mensagem enunciada pelo trovão. Todavia, é-lhe recomendado guardá-la em segredo, e nada escrever. A ordem é dada por alguém não identificado, mas vem diretamente do céu. João não lhe questiona a autoridade; reconhece-a como divina. Alguns pensam ser a voz de Deus ou a de Cristo. "Guarda...e não as escrevas". É uma forma hebraística de dizer que os trovões contém revelações que ainda não podem ser conhecidas. A
Daniel foi ordenado que selasse o livro até o tempo do fim (Dn 12.4,9). Porém, estas mensagens jamais serão reveladas nesta presente era. O fato de a Bíblia mencionar os sete trovões já é, em si, algo mui importante: deixa-nos saber que algumas coisas hão de acontecer na terra no fim dos tempos. Tal fato deveria levar-nos a ser mais cuidadosos e não excessivamente dogmáticos acerca da sequencia dos eventos do Apocalipse. Certamente não deveríamos nem tentar especular sobre a mensagem dos sete trovões. Os que o fazem não conseguem acrescentar nada de novo; só especulações tolas.
III - Não Haverá Mais Demora (Ap 10.5,6)
"E o anjo que vi estar sobre o mar e sobre a terra levantou a sua mão ao céu, e jurou por aquele que vive para todo o sempre, o qual criou o céu e o que nele há, e a terra e o que nela há, e o mar e o que nele há, que não haveria mais demora."
João acata a ordem que lhe é dada; não registra a mensagem dos trovões. Agora, volta sua atenção ao anjo que havia se colocado entre o mar e a terra. O original grego mostra que o anjo levantou sua mão direita em direção ao céu (o pequeno livro deveria estar em sua mão esquerda). Este é um gesto que demonstra o reconhecimento da soberania divina. Era assim que se fazia os juramentos nos tempos antigos (Dt 32.40; Dn 12.7). Com voz solene, o anjo faz o seu juramento no nome daquele "que vive para sempre", o Criador de todo o Universo. O juramento é feito no nome de Deus e do Cordeiro (Ap 4.10,11; 5.13). Ao especificar o "céu", a "terra", o "mar" e tudo o que neles há, o anjo estabelece um contraste com a falsa adoração dos rebeldes mencionados em Apocalipse 9.20,21. A adoração dos ídolos, que não têm poder para nada, em comparação com a adoração daquele que criou todas as coisas, é realmente flagrante. O julgamento do mundo está chegando. O Deus eterno e seu Filho, que com Ele compartilhou todo o trabalho da criação, estão no comando de tudo. Deus seguiu um plano na criação como no-lo mostra Gênesis capítulo um, mas agora dá sequencia ao seu plano de redenção. Ele mesmo encarrega-se de que este seja fielmente cumprido. O conteúdo do juramento feito pelo anjo, no versículo seis, constituisse numa mensagem a toda a humanidade: "Não haverá mais demora". Alguns interpretam a declaração como que dizendo que o tempo, em si, está para terminar, e a eternidade, que independe da contagem do tempo, está praticamente começando. Mas a Bíblia não nos fala o suficiente sobre a eternidade para afirmarmos que ela será algo independente do tempo. A ideia de que na
eternidade não haverá contagem de tempo parece se originar de teorias humanas; não tem nada a ver com a Bíblia. (5) Na realidade, o Novo Testamento frequentemente refere-se à era da Igreja como "este século", e ao futuro como "o século vindouro" (Mc 10.30; Lc 20.34,35; Ef 1.21). Até mesmo os gregos olhavam a eternidade como "o século dos séculos sem fim" (compare o plural de ambos em G1 1.5; Fp 4.10; 1 Tm 1.17; 2 Tm 4.18; Hb 13.21). Parece que haverá algum tipo de existência progressiva segundo uma cronologia que lembre a nossa. Na Nova Jerusalém, de igual modo, a árvore da vida dará o seu fruto todo mês (Ap 22.2). Certamente, no momento em que o anjo fez o juramento, havia um considerável período de tempo a ser ainda percorrido: os mil anos do milênio, por exemplo. A mensagem do anjo era urgente. A sétima trombeta estava prestes a ser soada; o interlúdio chegaria ao fim. Apesar de chronos, ou tempo, normalmente significar "um período de tempo", pode também indicar "demora". O verbo correspondente ("chroniz") refere-se sempre a "demorar". Assim, "demora", aqui, é o sentido correto. Mas os eventos que se seguem ocorrerão rapidamente. Isto também quer dizer que o tempo, no qual os pecadores poderiam arrepender-se, está terminando. O propósito de Deus para o término desta era está por se revelar.
IV - As Boas Novas Anunciadas Pelos Profetas (Ap 10.7)
"Mas nos dias da voz do sétimo anjo, quando tocar a sua trombeta, se cumprirá o segredo de Deus, como anunciou aos profetas, seus servos."
Reforçando a declaração de que não haveria mais demora, o "mas" introduz um programa contrastante. Durante "os dias do" som da sétima trombeta (que está para ser tocada) o mistério de Deus, os quais Ele havia anunciado a seus servos, os profetas, será "cumprido". Isto é: o som desta trombeta continuará por um tempo, que provavelmente incluirá o derramar das sete taças da ira de Deus, a derrota final do Anticristo, e o início do Milênio. Ou seja: todos os eventos até o capítulo 20. Alguns supõem que "o mistério de Deus" signifique a salvacão. (6) A interpretação mais simples é que se refira a um novo entendimento da natureza, plano e propósito de Deus. A palavra mistério é frequentemente usada na Bíblia para indicar alguma coisa que, parcialmente revelada no Antigo Testamento, é plenamente mostrada no Novo (Cl 1.26,27; 2.2). "Declarada" e "anunciada" são as duas palavras mais usadas no Novo Testamento para denotar a pregação do Evangelho, que é a proclamação das Boas Novas de salvação em Cristo. Esta salvação abrange toda nossa herança, que receberemos quando da volta de Jesus. Ela inclui tudo o que os profetas previram, incluindo o futuro reino a até o novo céu a e nova
terra. Assim que tais coisas acontecerem, então se cumprirão as profecias do Antigo Testamento sobre o julgamento e a restauração. Ficará claro, então, que Deus é um Deus fiel, que sabe o que está fazendo. Os profetas do Antigo Testamento deixaram claro que o pecado e a corrupção têm de ser banidos da terra antes da implantação do Reino de Deus. Isto implicará na substituição de qualquer coisa destituída da glória de Deus por ocasião da vinda de Cristo. Em pouco não haverá mais nenhuma fase do plano de Deus envolta em mistério.
V - João Come o Livro que lhe E Dado pelo Anjo (Ap 10.840)
“E a voz que eu do céu tinha ouvido, tomou a falar comigo, e disse: Vai, e toma o livrinho aberto da mão do anjo que está em pé sobre o mar e sobre a terra. E fui ao anjo, dizendo-lhe: Dá- me o livrinho. E ele disse-me: Toma-o, e come-o, e ele fará amargo o teu ventre, mas na tua boca será doce como mel. E tomei o livrinho da mão do anjo, e comi-o; e na minha boca era doce como mel; e havendo-o comido, o meu ventre ficou amargo.”
Pela terceira vez, João ouve a voz vinda do céu (ver Ap 4.1; 10,4). Ele recebe ordens de ir até o anjo, que estava com um pé sobre a terra e o outro sobre o mar, e "pegar o pequeno livro" que se achava aberto. A mensagem que o anjo está prestes a anunciar à terra, há de ser conhecida primeiramente por João. Há muitas especulações sobre o conteúdo deste livro: 1) É o mesmo livro no qual estavam os sete selos (ver Ap 5.1); 2) É uma mensagem de "ais" aos incrédulos; 3) E uma mensagem à Igreja? 4) E uma revelação dos eventos narrados do capítulo 11 ao 19. Ou, ainda, a revelação dada no capítulo ll. (7) O livro é em formato de miniatura, representando toda a palavra de Deus que havia sido dada até este ponto pelo Espírito Santo. Desde que se encontra na mão direita do anjo poderoso, deve representar os propósitos divinos para os homens. João vai, então, até o anjo, e pede-lhe o livro, mesmo que não lhe tenha sido adiantado o que fazer com ele. Em seguida, o anjo dá-lhe instruções para que coma todo o livro, e diz-lhe qual seria o paladar: doce na boca, mas amargo no estômago. A Bíblia não explica qual o significado do comer o livro. Linguagem idêntica é usada em Ezequiel 2.8 a 3.3, onde vemos que a chamada do profeta inclui a ordem de se comer um livro cheio de lamentações e prantos, mas que tinha gosto adocicado. Isto demonstra que Ezequiel tinha de digerir a mensagem que lhe fora entregue por Deus, fazendo dela parte de sua própria pessoa, antes de proclamá-la ao povo. Jeremias narra também ter comido a Palavra de Deus, e ela foi-lhe de gozo e alegria no coração (Jr 15.16). O salmista compara os ensinamentos da Palavra de Deus com o mel (SI 19.10; 119.103). Aqueles cujos corações estão abertos a recebê-la, terão o Espírito Santo ungindo-os e levando-os à presença do Senhor. O que pode haver mais doce que o mel? Nós também devemos comê-la, digeri-la. Temos de deixar o Espírito Santo, que a inspirou, iluminá-la e aplicá-la à nossa vida. Mas a Palavra de Deus não contém apenas o doce. O Evangelho fala tanto do julgamento como da misericórdia. (8) Ao proclamar a mensagem divina, Ezequiel teve de passar por experiências amargas. O mesmo aconteceu com Jeremias. Certa vez foi levado a desistir do ministério. Foi aí, porém, que ele certificou-se de quão doce é a Palavra de Deus. Ela tornou-se como que um fogo em seus ossos, de forma que o profeta teve de continuar (Jr 28.8,9). Semelhantemente, o livro que João come tem algo mais. Torna- se amargo no estômago do evangelista. Na Bíblia, estômago é outra palavra usada para designar o coração e as emoções - o interior do ser humano. Apesar de João ter se alegrado ao provar a doçura da palavra de Deus (a doce presença do Espírito Santo jamais o abandonou), percebe que deve também proclamá-la. Eis que lhe vem o amargo. Embora estivesse com o coração partido, o apóstolo do amor tem de proclamar que julgamentos ainda mais terríveis virão. Nisto, assemelha-se a Jesus que, com a alma dorida, chorou sobre Jerusalém, sabendo o que aconteceria a esta e ao seu povo (Lc 19.41-44). Nossa antecipação do retorno de Cristo para estabelecer seu reino sobre a terra é um sentimento doce. Contudo, ao nos conscientizarmos de que as nações devem ser esmigalhadas como vasos de barro (SI 2.9; Dn 2.35,44), ficamos com uma sensação amarga. Nenhum dos que tem o coração cheio de amor de Cristo, alegra-se ao pensar no julgamento vindouro - a Grande Tribulação. O próprio Deus não quer que ninguém pereça. Ele prova o seu amor pelo fato de Cristo ter morrido por nós quando ainda éramos pecadores (2 Pe 3.9; Rm 5.8).
VI - João Deve Continuar a Profetizar (Ap 10.11)
“E ele disse-me: Importa que profetizes outra vez a muitos povos, e nações, e línguas e reis.”
Assim como o comer o livro fez parte da missão de Ezequiel como profeta, da mesma forma dá-se com João. Tal ato é seguido por uma chamada de Deus para que escreva as profecias. Talvez necessitasse ele de ouvir novamente acerca da importância da mensagem e da urgência com que ela deva ser divulgada. É o que lhe deixa claro esse anjo poderoso.
Mesmo estando exilado em Patmos, João tem a exercer um grande ministério. Deveria profetizar de novo, não somente às sete Igrejas da Ásia e aos seus contemporâneos, mas aos reis e potentados e aos povos de outras línguas e tempos. Isto não significa que João estivesse para ser mandado pessoalmente a tais povos e reis. O grego epi, no dativo, é traduzido como ""a", "a respeito", "diante", "contra", "para".(9) Considerando que os julgamentos se seguem imediatamente (correspondendo ao fato de o livro ficar amargo), parece que "contra" tem o melhor sentido. Em todo caso, fica claro que as profecias de João terão um efeito mundial, pois as sete taças são os julgamentos mais completos, sendo seus efeitos sentidos em todo o planeta
Fonte: HORTON, Stanley. Apocalipse, as coisas que brevemente devem acontecer. 7º Ed. 2011. Rio de Janeiro. CPAD.
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